TEMATICA VARIADA, COM MAIOR INCIDÊNCIA NA MUSICA GENERALISTA, E NA FOTOGRAFIA, OBVIAMENTE COMO PILAR DE ESTAS DUAS FORMAS DE ARTE, ESTARÁ A POESIA
sábado, 16 de junho de 2012
Florbela Espanca
Anoitecer
A luz desmaia num fulgor de aurora,
Diz-nos adeus religiosamente...
E eu que não creio em nada, sou mais crente
Do que em menina, um dia, o fui... outrora...
Não sei o que em mim ri, o que em mim chora,
Tenho bençãos de amor pra toda a gente!
E a minha alma, sombria e penitente,
Soluça no infinito desta hora...
Horas tristes que são o meu rosário...
Ó minha cruz de tão pesado lenho!
Ó meu áspero e intérmino Calvário!
E a esta hora tudo em mim revive:
Saudades de saudades que não tenho...
Sonhos que são os sonhos dos que eu tive...
Florbela Espanca
Esquecimento
Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.
Tudo em meu redor então escureceu,
E foi longínqua toda a claridade!
Ceguei... tacteio sombras... que ansiedade!
Apalpo cinzas porque tudo ardeu!
Descem em mim poentes de Novembro...
A sombra dos meus olhos, a escurecer...
Veste de roxo e negro os crisantemos...
E desse que era meu já me não lembro...
Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos!...
Florbela Espanca
A cerâmica de laura zindel
Insectos, serpentes e outros animais à mesa e espalhados pela casa? Que não falem já mais alto todas as fobias. Esta é a proposta da designer americana Laura Zindel que, em parceria com o seu marido, cria algumas das mais requintadas peças cerâmicas ornadas dos mais belos e intrincados motivos naturais, e de algumas criaturas que, enfim, a grande maioria das pessoas gostaria de manter à distância.
A cerâmica requintada da americana Laura Zindel parece ser uma curiosa oposição ao terror generalizado de insectos, répteis e rastejantes diversos. O design fica ao cuidado de Laura e de seu marido, Thorsten Zindel Lauterbach, vivendo o casal numa antiquíssima casa de quinta, no estado de Vermont, agora quase transformada num ateliê.
Os trabalhos são inspirados na Natureza e nos “Cabinets of Curiosity” vitorianos, marcas da arte de coleccionar todo o tipo de relíquias, da etnografia e arqueologia, passando pela geologia e restante história natural, muitas vezes em dissecações dignas de museu.
À primeira vista não seria muito convidativo fazer refeições em pratos onde surgem tarântulas, abelhas, libélulas, cobras, plantas, pássaros e até ovos, mas a simplicidade, a beleza singular e a riqueza de detalhes das ilustrações sobre a porcelana branca é tal que esta ganha vida.
Os desenhos a preto e branco são feitos à mão com lápis e impressos na peça em esmalte, a qual é depois cozida para fixar as imagens, numa versão moderna de um processo denominado ‘transferware’, aplicado pela primeira vez no séc. XVIII. O que era antes um processo laborioso e dispendioso, foi facilitado por esta técnica que
produz linhas finas similares às gravuras de livros antigos.
As peças de Laura, que pedem emprestados designs naturais, formam uma gama de objectos de cozinha, pratos, taças, copos e afins, bem como elementos decorativos, tais como jarras e vasos. Todos os anteriores são feitos com materiais não tóxicos, seguros para os alimentos, e exigem alguns cuidados especiais de utilização e lavagem para uma maior durabilidade. Quanto aos preços, vão de algumas dezenas até várias centenas de dólares, sendo que a peça mais cara ronda os 500USD.
O amor da artista pela ilustração e pela Natureza associa-se ao gosto pela simetria, numa complexidade refinada que origina belíssimos padrões ornamentais.
O casal Zindel espera que o seu trabalho de precisão científica e imaginário vitoriano provoque um repensar dos materiais e da temática usada, desejando também que as suas peças cativantes passem de geração em geração, tornando-se elementos icónicos no seio familiar.
Laura Zindel
E não viveram felizes para sempre
Tudo começa com "Era uma vez" e termina em "E foram felizes para sempre". O desenrolar da história perde-se num momento, numa ocasião. O interruptor da luz impulsiona a narrativa e, depois de para sempre, há o mergulho na escuridão. O fim da história. Para sempre é muito tempo. Que promessa é esta? Que certeza? Como pode um final feliz terminar com um ponto final? Onde estão as vírgulas, as interrogações das incertezas e as reticências do silêncio? Conheça o disparo do fotógrafo Thomas Czarnecki sobre os contos de fada
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© Thomas Czarnecki, "The little Mermaid - On the other shore".
Conto. Não conto. Conto? Este conto não tem um final feliz. O seu fim é trágico, o ambiente é decadente, obscuro e mórbido. As personagens são figuras femininas da Disney que o leitor talvez reconheça como princesas. O tempo, esse, se mantém: "era uma vez..." E o fim? Como seria de esperar, é “Não viveram felizes para sempre”.
"From Enchantement to Down" ("Do encantamento à queda") é o disparo lançado pela objectiva do fotógrafo Thomas Czarnecki, que torna os contos de fada da Disney não num sonho, mas num pesadelo. Czarnecki estudou publicidade em Saint-Luc, na Bélgica, e é o atual diretor de arte da Leo Burnett, em Paris, continuando a trabalhar como fotógrafo freelancer.
O choque entre a inocência dos contos de fadas e a realidade sombria da cultura foram a alavanca que levaram o fotógrafo às encruzilhadas da inocência e doçura das personagens da Disney bem como a recriar um novo universo. Um campo imaginário com um destino fatal, de personagens sem encanto, e o confronto do universo ingénuo e inocente dos contos de fadas com a realidade. O mistério está no autor da tragédia, que não se encontra presente.
© Thomas Czarnecki, "Cinderella - Too fast".
As doze badaladas da meia noite não assinalavam simplesmente a fuga da Cinderela. A pressa determinou a sua morte, sendo assinalada pela perda do sapato.
© Thomas Czarnecki, "Snow White - My sweet Prince".
A Branca de Neve não foi salva pelo príncipe. Terá sido verdadeiro e decisivo o golpe da rainha? O mesmo acontece com o Capuchinho Vermelho. Atacada pelo lobo? Imagens sinistras, cenas de crime e quartos abandonados traduzem a inquietação da narrativa.
© Thomas Czarnecki, "The little red ridding hood - Happy end".
© Thomas Czarnecki, "Spleeping Beauty - Naughty girl".
A Bela Adormecida, afinal, foi vítima da sua desobediência e comportamentos impróprios. A maldição estava incutida nela própria e não no exterior.
© Thomas Czarnecki, "Pocahontas - One more trophy".
Pocahontas era apenas um mito romântico. Thomas Czarnecki retrata-a como um troféu de alguém – uma vitória que viola os princípios da ética e é fortemente desencorajada.
© Thomas Czarnecki, "The Beauty and the Beast - Not so romantic".
© Thomas Czarnecki, "Jasmine - One last wish".
A Bela e a Fera ficaram aquém do romantismo, a Jasmine foi intoxicada com o seu último desejo, a Pequena Sereia morreu na praia e a ambição e curiosidade da Alice no Pais das Maravilhas aprisionaram-na a uma caverna sombria. O símbolo da sua curiosidade, o coelho branco, jaz morto.
© Thomas Czarnecki, "Alice - just a trap".
As fotografias de Thomas Czarnecki são o último suspiro dos contos de fadas, questionando as suas promessas e profecias.
sexta-feira, 15 de junho de 2012
quinta-feira, 14 de junho de 2012
quarta-feira, 13 de junho de 2012
Fernado Pessoa
A única realidade para mim são as minhas sensações.
A única realidade para mim são as minhas sensações. Eu sou uma sensação minha. Portanto nem da minha própria existência estou certo. Posso está-lo apenas daquelas sensações a que eu chamo minhas.
A verdade? É uma coisa exterior? Não posso ter a certeza dela, porque não é uma sensação minha, e eu só destas tenho a certeza. Uma sensação minha? De quê?
Procurar o sonho é pois procurar a verdade, visto que a única verdade para mim, sou eu próprio. Isolar-se tanto quanto possível dos outros é respeitar a verdade.
Fernado Pessoa
Fernando Pessoa
(Lisboa, 13 de Junho de 1888 —
Lisboa, 30 de Novembro de 1935)
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havermos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!
Fernando Pessoa
Sangrando
Sangrando
Conta-me historias
Devagar
Devagarinho
Em chagas
Muitas chagas
Como á noite o sofrimento!
Conta-me historias
Para ver se encontro
Descanso para a minha alma.